“Me ajuda a desestressar”. Esse é o argumento da atiradora esportiva Luciana Gil para aderir à prática. Ela é uma das mulheres que compõem os 30% de público feminino na atividade em Goiás. O estado tem até uma representante da categoria que viaja o País defendendo a bandeiras delas nos clubes de tiro, a palestrante do SPA para mulheres – Soco, Porrada e Armas – Julia Vitória.
Os goianos já têm o terceiro maior número nacional de registros ativos de colecionadores, atiradores esportivos e caçadores – os CAC’s – e concentra boa parte de clubes de tiro e lojas de arma de fogo brasileiros, segundo dados do Exército obtidos pelo Instituto Sou da Paz. A explicação para o crescente interesse das pessoas pelo uso de armas de fogo é multifatorial.
A segurança pessoal vem à mente, mas passa pela sensação de poder, curiosidade e até hobby. No caso das mulheres, a autodefesa figura como uma das principais razões. E faz todo sentido em um país em que 81% delas já passou por algum tipo de violência nos deslocamentos, conforme pesquisa do ano passado feita pelos institutos Locomotiva e Patrícia Galvão, com apoio da ONU Mulheres e Uber.
“Atendo de motoboys a empresários e produtores rurais. A maioria busca a sensação de segurança para a família e depois o esporte. Cresceu muito de 2015 a 2018. Foi cerca de 50% nesse período e a partir disso subiu 300%. A presença de mulheres de todas as idades, inclusive senhoras, nos últimos sete anos está na casa dos 30%”, afirma o instrutor de tiro Wene Duarte, que também é dono da Elite Despachante de armas e Weapon Fire armas e munições.
Ele é casado com Luciana, que iniciou no esporte pela influência indireta da profissão do marido. Já são 14 anos na área e também como empresária no ramo de armas. O preconceito nunca fez parte da rotina e não esconde de ninguém o estilo de vida.
“Até uso isso para divulgação de armas, cursos e do que é ser CAC. Me sinto mais segura porque a única coisa que vai igualar a minha força física com a de um agressor homem é se estiver com minha arma em punho”, explica.
Em entrevista ao programa O Mundo em sua Casa, a instrutora de tiro Júlia Vitória chamou atenção para esse aspecto. Ela foi vítima de violência e percebeu que a atividade seria uma oportunidade de superação. “Um dia fiquei muito traumatizada, mas eu não queria ser só mais uma na estatística de mulheres que já sofreram algum tipo de agressão”, afirmou.
Nada de modinha passageira
De acordo com o proprietário do clube de tiro TZB, Hugo Santos, a adesão do público ao esporte faz parte de um processo iniciado no governo Dilma, continuado na gestão Temer e em vigor na presidência de Jair Bolsonaro. O posicionamento armamentista do atual governo não estaria ligado ao crescimento da atividade, na perspectiva dele.
“Ainda existe muita falta de informação e um receio histórico em relação a armas de fogo. As pessoas têm medo. Para elas, é como se a arma tivesse vontade própria sendo que é a mesma coisa de um veículo ou uma faca. Eles podem ser usados para fazer o mal, mas a decisão de como vai ser usada essa ferramenta é do ser humano. Isso vale para veneno, pedra e até palavras”, defende.
Trâmite
Por lei, o porte e a comercialização de armas e munições é proibida no Brasil. A exceção vale para categorias como a de atiradores esportivos. Para se tornar um CAC é necessário ser filiado a um clube de tiro, ter capacitação técnica e passar por avaliação psicológica, apresentar certidões criminais negativas e informar um local adequado para guardar a arma. Ao final, o candidato recebe um Certificado de Registro, que custa cerca de R$100.