Primeiro Comando da Capital Chega a 28 Países com mais de 2 Mil Membros; Paraguai Lidera e Portugal se Destaca na Europa

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O DE tem mais de 2 mil integrantes espalhados pelo mundo, a maioria em presídios;
veja países

Paraguai tem o maior número de integrantes. Portugal lidera na Europa.
Mapeamento obtido com exclusividade pela GloboNews e DE mostra que facção
criminosa se instalou em pelo menos quatro continentes para cometer crimes
transnacionais, como lavagem de dinheiro.

A facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) tem ao menos 2.078
integrantes espalhados por 28 países pelo mundo. Mais da metade, 1.092 estão
dentro de presídios fora do Brasil.

O Paraguai é o país que concentra o maior número de integrantes: 699, sendo 341
presos e 358 soltos. Já há integrantes da facção dentro de presídios europeus:
Espanha, França, Holanda e Irlanda.

No total, incluindo o Brasil, o DE tem cerca de 40 mil integrantes.

Os números constam em um mapeamento do Ministério Público de São Paulo obtido
com exclusividade pela DENews e DE. O relatório tem sido apresentado a
embaixadas e consulados fora do país para cooperação internacional no combate a
crimes transnacionais em pelo menos quatro continentes.

O mapeamento é fruto de um cruzamento de informações de inteligência,
coletadas por meio do monitoramento de integrantes do DE que fazem parte das
chamadas “Sintonia dos Estados” e “Sintonia dos Países”, setor do DE cujos
membros são responsáveis pelo acompanhamento do desenvolvimento da facção fora
do estado de São Paulo e fora do Brasil, além da análise de dados a partir da
quebra do sigilo telefônico e telemático de investigados e da troca de
informações com autoridades estrangeiras.

Além da expansão para diferentes territórios, o que tem chamado a atenção das
autoridades e investigadores brasileiros e também estrangeiros é o fato de os
integrantes do DE terem buscados outros países não só para viagens temporárias,
mas também como moradia fixa e infiltração em cadeias, uma espécie de “marca
registrada” da facção criminosa paulista.

O DE é mapeado em 28 países e expande tráfico de drogas e armas

* Prisão, delação, portos e rotas: os bastidores da conexão entre o DE e a
máfia italiana

A pesquisadora da Universidade Federal do ABC (UFABC), Camila Nunes Dias, também
especialista em sistema prisional e criminalidade organizada, chama a atenção
para a diferença entre a passagem de criminosos em um determinado país para
fazer negócios – o que não causa impactos relevantes do ponto de vista da
violência – e o movimento de permanência nos territórios de interesse da facção.

O DE e a confirmação da presença mais duradoura do DE em países
vizinhos é antiga. A infiltração nos presídios do Paraguai, por exemplo, já
refletiu em disputa violenta de poder nas cadeias. Em 2019, uma rebelião
liderada por integrantes da facção paulista deixou dez detentos mortos e outros
12 feridos na penitenciária de San Pedro.

A pesquisadora Camila Nunes chama a atenção para o movimento que começou em
países de fronteira com o Brasil. “No Paraguai, essa violência dentro das
prisões é uma realidade que não existia antes. […] Chama atenção pelo
potencial efeito que isso pode gerar [a presença do DE em presídios] porque é
justamente dentro das prisões que o DE encontra o ambiente é mais adequado para
se expandir, para se fortalecer e para se fixar”.

“Eu não conheço nenhuma organização criminosa no mundo, que seja mais
eficiente, no que diz respeito ao controle territorial dentro do sistema
prisional, do que DE.”

“Eles fizeram isso no Paraguai, depois eles acabam sufocando as facções locais.
Depois eles saem em liberdade ou têm os comparsas de liberdade, eles vão
batizando os nacionais daquele país. Isso aconteceu no Paraguai, está
acontecendo hoje na Argentina, no Chile e com certeza vai acontecer na Europa,
principalmente em Portugal, onde já há integrantes do DE presos e já há também
portugueses batizados”, explica o promotor Lincoln Gakiya.

Portugal tem cerca de 10 milhões de habitantes e uma conexão histórica muito
forte com o Brasil. As poucas barreiras com o idioma e a presença massiva de
brasileiros residentes naquele país são apontados como algumas das principais
razões pelas quais o DE decidiu investir em moradia fixa de importantes
traficantes ligados à facção e a infiltração nos presídios para recrutamento.

No levantamento exclusivo obtido pela DENews e pelo DE, Portugal aparece em
5º lugar da lista de países com o maior número de integrantes do grupo criminoso
e é o principal país da Europa em proporção da presença da facção.

Isso tem se refletido em prisões em flagrante, apreensões de drogas e
investigações sobre o DE por parte das autoridades portuguesas. Nos últimos
anos, as polícias locais confirmam terem prendidos membros da facção tentando
levar cocaína em submarinos e em outras embarcações adaptadas pelo crime
organizado para cruzar o Oceano Atlântico até a Europa.

Em março, uma embarcação com cerca de 6,5 toneladas de cocaína, por exemplo, foi
apreendida em alto-mar, na costa marítima de Portugal, após uma operação
conjunta entre autoridades portuguesas e espanholas. Os cinco tripulantes foram
presos, sendo três deles paraenses. Imagens gravadas pela Marinha portuguesa
mostram a parte externa do barco e também partes internas, como o local onde os
tripulantes dormiam e as drogas em fardos empilhados em uma espécie de porão.

Uchoa relata que desde que chegou em Portugal, há dois anos, tem percebido maior
preocupação das autoridades portuguesas como ponto estratégico nessa expansão do
DE. Ele relembra que Portugal possui uma enorme população de origem brasileira,
que fala português e tem muitas proximidades culturais, o que possibilita a
infiltração de criminosos ligados a organização sem ser percebidos dentro dessa
comunidade e conseguir investir na atuação criminal.

“A gente tem algumas evidências de que Portugal tem tido um papel central nessa
logística do DE, por exemplo, quando a gente teve recentemente a prisão de um
mergulhador ligado ao DE em Lisboa. Com ele foram apreendidas armas de fogo e
motos subaquáticas. Houve também uma operação da polícia portuguesa em portos de
Portugal, onde ficou confirmado que integrantes da organização criminosa estavam
subornando funcionários públicos portugueses para deixarem que a cocaína fosse
descarregada nesses portos para que depois fossem colocadas em caminhões e
fossem direcionadas para a Espanha”, detalha Uchoa.

Itália é considerada outra importante rota para a entrada de cocaína pelo
tráfico internacional de drogas. Nos últimos anos, máfias italianas se uniram ao
DE para remessas, a partir dos países produtores na América do Sul com destino
à Europa. E apesar de ter menos integrantes da facção fixados em seu território
ou em presídios, a Itália é apontada como uma das maiores preocupações das
autoridades brasileiras para combate ao narcotráfico, o que demanda integração.

Informações detalhadas sobre o esquema entre o DE e a máfia da Calábria foram
reveladas pelo traficante italiano Vincenzo Pasquino preso no Brasil e
extraditado, que fez acordo de delação com a Justiça da Itália e está preso em
Roma. Pasquino morou na cidade de São Paulo, onde negociava com a facção
criminosa. Os carregamentos saíam do país em grande quantidade pelo mar para
famílias de mafiosos na Itália.

A Sérvia é um deles. Apontada como uma rota para tráfico de armas, segundo o
promotor do Lincoln Gakiya, a presença do DE na região possivelmente se deve a
algum tipo de acordo para facilitar a também logística de compra e venda de
armas, que nem sempre é feita por italianos. Segundo ele, há muita logística
também feita por sérvios e por albaneses.

Já o Líbano não é visto como um país fornecedor ou mesmo destino final de
drogas. Por isso, a presença do DE é vista como uma possibilidade de conexão
com lavagem de dinheiro, chamado por analistas de “convergências criminais de
grupos criminosos”.

“Embora não tenham os mesmos interesses, o DE tem um interesse, sobretudo, no
narcotráfico. Então isso pode indicar que operadores financeiros estejam atuando
ali naquela região, facilitando a lavagem, tanto para o DE quanto para
organizações que financiam o terrorismo. Isso que a gente chama de convergência
criminal”, segundo Gakiya.

Um alerta similar partiu do país vizinho ao Líbano, Israel. Relatórios de
Inteligência Financeira (RIFs) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(Coaf), obtidos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público de São Paulo,
indicam que uma fintech de propriedade de um policial civil se envolveu em
transações suspeitas com criptomoedas relacionadas a organizações terroristas. Os relatórios não dão os nomes das organizações terroristas.

Do outro lado do mapa, o Japão tem registro de presença definitiva do DE. É
destino final para a venda de cocaína, mas permanência de traficantes no
continente asiático é vista como possibilidade para favorecer o tráfico na
região de Hong Kong e também para Oceania, como a Austrália, por causa do valor
médio do quilo da droga, que pode passar de US$ 150 mil.

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