Atrasos e descontinuidade política: o que se sabe sobre os semáforos
inteligentes em Ribeirão Preto
Projeto dividido em três etapas foi orçado em mais de R$ 120 milhões para a
cidade. Além de problemas técnicos na entrega da primeira fase, segunda fase não
foi iniciada por decisão da Prefeitura na sucessão de mandato.
1 de 3 Motoristas aguardam semáforo abrir na Avenida Independência em Ribeirão
Preto, SP — Foto: Cacá Trovó/EPTV
Motoristas aguardam semáforo abrir na Avenida Independência em Ribeirão Preto,
SP — Foto: Cacá Trovó/EPTV
Anunciado com a promessa de tornar Ribeirão Preto (SP) uma
cidade conectada e com um trânsito mais seguro, o sistema inteligente de
semáforos pode se tornar ineficiente na maior parte do município.
Dividido em diferentes etapas que custariam mais de R$ 120 milhões ao município,
o projeto foi marcado por atrasos e problemas técnicos na implementação da
primeira fase na gestão anterior e, mais recentemente, por uma descontinuidade
no atual comando da Prefeitura.
Por um lado, a atual fase, referente ao sistema norte-sul dos corredores de
ônibus, avaliada em mais de R$ 20 milhões e ainda que em execução, foi
prejudicada por atrasos e problemas técnicos, segundo autoridades ouvidas em uma
comissão parlamentar de inquérito (CPI) sobre o caso na Câmara.
Por outro lado, a segunda fase, que contemplaria o eixo leste-oeste dos
corredores, não foi iniciada, porque, logo após a sucessão de mandato, em
janeiro, a nova administração suspendeu uma licitação de R$ 34,8 milhões que
havia sido lançada em 2024.
Esta semana, a Prefeitura confirmou que optou por não dar continuidade ao
projeto sob a justificativa de que ele teve problemas de execução na primeira
fase.
Uma terceira etapa, a maior de todas e avaliada em R$ 66 milhões, chegou a ser
projetada por R$ 1,4 milhão, mas não chegou a ser licitada.
Diante desse cenário, mesmo que a primeira etapa do ITS seja concluída, os
semáforos inteligentes podem funcionar apenas em parte do trânsito de Ribeirão
Preto, sem perspectiva de contemplar outros trechos.
O QUE É O SISTEMA INTELIGENTE DE SEMÁFOROS?
O sistema inteligente de semáforos é um conjunto de equipamentos e softwares
que, integrados, reúnem todas as informações necessárias para garantir que o
trânsito seja mais rápido e seguro para automóveis e principalmente ônibus do
transporte público.
O sistema, chamado de ITS, conta com câmeras, sensores, semáforos adaptativos –
mais modernos que os tradicionais, com temporizadores fixos – e painéis
informativos digitais.
Tudo isso é interligado por uma rede de cabos de fibra ótica a uma central de
controle de operações (CCO) na RP Mobi, a empresa de transporte da cidade,
responsável por tomar as decisões com base nas informações que chegam e que
ficarão disponíveis em um grande painel com monitores mostrando em tempo real os
diferentes pontos da cidade.
Além de ajudar o município a organizar melhor os fluxos, o sistema também foi
projetado para levar informações diretamente aos moradores, já que os dados
também devem alimentar aplicativos de geolocalização e até autoridades como a
Defesa Civil, para alertas, quando necessário.
PARA ONDE FOI PROJETADO?
Quando foi anunciado, o projeto tinha o intuito de se integrar aos corredores de
ônibus, tanto no eixo norte-sul, quanto no eixo leste-oeste e na região central,
para modernizar as obras de mobilidade urbana de Ribeirão Preto.
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Para isso, a gestão anterior dividiu a implementação em três etapas diferentes –
ITS 1, 2 e 3 e, após a elaboração dos projetos executivos lançou duas licitações
que, somadas, representavam mais de R$ 54 milhões. Os recursos, segundo a
administração anterior, seriam financiados pela Caixa Econômica Federal.
“O ITS foi desenvolvido como um projeto em etapas, conforme exigências técnicas
e orçamentárias da Caixa Econômica Federal, responsável pelo financiamento e
pela fiscalização das obras. O cronograma faseado foi definido por um grupo
técnico formado pela Secretaria de Governo, Secretaria de Obras, RPMob (antiga
Transerp), Administração e Procuradoria do Município — uma decisão técnica e
institucional, e não política”, informa a assessoria do ex-prefeito Duarte
Nogueira.
Fase 1
É referente à implementação do sistema inteligente no corredor norte-sul,
abrangendo avenidas como Cavalheiro Paschoal Innecchi, Mogiana e Presidente
Vargas. Foi lançada pelo valor inicial de R$ 19,4 milhões em 2022 e está em
andamento pelo valor de R$ 20,4 milhões.
Fase 2
É referente à implementação do sistema inteligente no corredor leste-oeste,
abrangendo avenidas como Café, Dom Pedro, Saudade, Nove de Julho e Diederichsen.
A licitação foi lançada por R$ 34,8 milhões em 2024, mas foi cancelada pela
atual gestão.
Fase 3
O plano ainda teria uma terceira fase, a maior e mais cara de todas, para
modernizar os corredores de ônibus na região central, bem como avenidas
Costábile Romano, Castelo Branco, Coronel Fernando Ferreira Leite, Francisco
Junqueira, Jerônimo Gonçalves e Nove de Julho, além de garantir a interligação
do centro de controle de operações (CCO) à Avenida Dom Pedro I. Também previa 15
sinalizações luminosas de grande porte para orientação veicular.
O projeto executivo foi elaborado em outubro de 2024 ao custo de R$ 1,4 milhão,
mas a licitação das obras, avaliada em R$ 66 milhões, não chegou a ser lançada
por falta de previsão orçamentária na gestão passada.
O QUE ACONTECEU COM A PRIMEIRA FASE DO PROJETO?
CPI dos Semáforos: superintendente da RP Mobi presta depoimento em Ribeirão
Preto
A fase 1 do projeto, referente aos corredores norte-sul, foi licitada e
contratada por R$ 19,4 milhões em 2022. O vencedor do processo foi o Consórcio
ITS, formado pela Sigma Engenharia, Kapsch TraffcCom e Sitran Sinalização de
Trânsito, contratados para entregar tudo até maio de 2025 com a instalação de 90
equipamentos em cruzamentos e 30 controladores.
O contrato foi atualizado duas vezes, e o projeto atualmente está orçado em R$
20,4 milhões. Por conta do atraso na entrega, ele passou a ser alvo de uma CPI
na Câmara.
A comissão, até agora, apurou que, devido a uma obstrução em dutos que seriam
destinados à passagem dos cabos de fibra ótica, parte das instalações não foi
concluída. Ouvido pelos parlamentares, o atual secretário de Obras Públicas,
Walter Telli, disse que o problema vinha sendo tratado, mas não foi resolvido
desde a gestão passada.
Isso porque a empresa que construiu um dos trechos do corredor de ônibus, a JZ
Engenharia, teria se recusado a corrigir o problema na Avenida Thomaz Alberto
Whatelly, alegando ter sido avisada muito tempo após entregar a obra.
Telli também confirmou que, mesmo sabendo desse problema, a atual gestão não
teria como questionar o contrato com o Consórcio ITS, pois ele está sendo
cumprido regularmente. Estima-se que mais de R$ 15 milhões já foram pagos à
empresa, segundo o cronograma de instalações. Apesar disso, o secretário disse
que, sem solucionar essa obstrução do cabeamento, o sistema está comprometido.
Para isso, ele usou até uma metáfora: “Você tem a tomada, tem a árvore de Natal
com as luzes, mas não tem o fio que liga na tomada.”
CPI dos Semáforos: ex-secretário cita dinheiro em caixa para fase 2 do projeto
Em uma audiência posterior, o ex-secretário de Obras, Pedro Pegoraro, por sua
vez, rebateu essas informações ao dizer que o projeto executivo do ITS foi
elaborado em um período próximo à construção dos corredores de ônibus e que as
pendências apenas não foram solucionadas devido à sucessão de governo.
“Não tem delay tão grande assim. Eles realmente começaram depois, mas durante a
execução do projeto executivo, que é aquele em que se planeja a obra, havia uma
conversa muito grande, tanto é que todos os postes e toda a rede de duto estão
dentro das especificações do ITS.”
Em função das alegações na CPI, a JZ Engenharia, empresa apontada como
responsável pelos dutos que apresentaram problemas, realizou uma revisão no
local apontado como problemático.
Segundo a assessoria de imprensa da Câmara Municipal, a empresa já fez os
levantamentos necessários, mas as desobstruções, sobretudo por conta de acúmulo
de concreto, ainda não tinham sido realizadas. De acordo com a Prefeitura, esse
trabalho deve ter custos adicionais ao município.
O QUE ACONTECEU COM A SEGUNDA FASE DO PROJETO?
A licitação da fase 2 do sistema inteligente foi lançada ainda na gestão
Nogueira em novembro de 2024 pelo valor de R$ 34,8 milhões com previsão inicial
de entrega dos envelopes com as propostas até 16 de janeiro deste ano.
Antes disso, no entanto, assim que assumiu, o prefeito Ricardo Silva suspendeu o
processo.
A alegação, segundo nota da Prefeitura enviada em divulgada em junho deste ano,
foi de que seria preciso realizar “uma análise criteriosa quanto à real
necessidade da contratação e à viabilidade de sua continuidade.” A avaliação,
até então, seguia em andamento.
Na última semana, ao ser questionada pelo DE, a Prefeitura confirmou que não
dará continuidade ao projeto pelos problemas da primeira etapa.
> “A Prefeitura de Ribeirão Preto informa que a decisão do atual governo de não
> dar continuidade às demais etapas do referido projeto decorre dos diversos
> problemas identificados na execução da primeira fase. Por responsabilidade e
> zelo com o uso dos recursos públicos, optou-se por não prosseguir com o
> cronograma de licitação elaborado pela gestão anterior.”
Representantes da gestão passada, por sua vez, alegam que atualmente o projeto
só depende da continuidade da atual administração.
“O sistema encontra-se pronto para ser concluído e colocado em operação plena.
Cabe à atual administração dar continuidade ao projeto iniciado em 2017 — não
apenas no campo da semaforização inteligente, mas também na consolidação das
obras estruturantes do programa Ribeirão Mobilidade, que transformaram Ribeirão
Preto em uma cidade moderna, conectada e preparada para os próximos desafios.”
O QUE JÁ ESTÁ EM FUNCIONAMENTO?
Segundo a RP Mobi, a Central de Controle Operacional (CCO) está em funcionamento
desde 2024 com as seguintes funcionalidades nos trechos onde o novo sistema foi
instalado:
– monitoramento remoto e contínuo de diversos semáforos;
– possibilidade de reiniciar equipamentos, solucionar falhas por instabilidades
quando necessário;
– ajuste dinâmico dos tempos de sinal conforme as condições do tráfego.
“Não mesmo ambiente, equipes do Departamento de Transporte têm acesso à
localização dos ônibus urbanos em tempo real (via GPS), às imagens ao vivo do
interior dos veículos e a dados de bilhetagem e planejamento, possibilitando uma
gestão mais eficiente do transporte coletivo.”
Segundo a empresa, os agentes de trânsito também utilizam a central de controle
com um espelhamento de câmeras disponibilizadas pela Guarda Civil Metropolitana
e pela Polícia Militar para garantir mais agilidade nas operações viárias.
Acrescentou ainda que a cidade já conta com um painel de mensagens variáveis
(PMV), operado a partir do CCO, e instalado na Avenida Independência, próximo à
Rua Rui Barbosa, com mensagens de alerta sobre o trânsito e de conscientização
aos condutores.
Vista área de Ribeirão Preto, SP — Foto: Reprodução/EPTV
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