Última atualização 07/03/2022 | 10:13
Inquérito policial, entregue na última sexta-feira (4), pede o indiciamento de sete policiais militares pela morte de quatro pessoas em uma chácara em Colinas do Sul, na região da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, no último dia 20 de janeiro. A investigações apontam para a possibilidade de uma emboscada, na qual as vítimas teriam sido rendidas antes de serem mortas.
As vítimas foram Salviano Souza Conceição, 63; Ozanir Batista da Silva, conhecido como Jacaré, 46; Alan Pereira Soares,28; e Antônio Fernandes da Cunha, 35. Eles foram abordados na chácara de Ozanir e, posteriormente, levados para a vizinha de Salviano. Pelas circunstâncias do crime, o indiciamento se deu por homicídio qualificado mediante “recurso que dificulte ou torne impossível a defesa” da vítima.
Os policiais efetuaram 58 tiros com quatro fuzis, duas pistolas e um revólver, sendo que pelo menos 10 atingiram os alvos. Na última semana, a Justiça acatou o pedido do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), e determinou a prisão dos sargentos Aguimar Prado de Morais e Mivaldo José Toledo, do cabo Jean Roberto Carneiro dos Santos e dos soldados Welborney Kristiano Lopes dos Santos, Luís César Mascarenhas Rodrigues, Ítallo Vinícius Rodrigues de Almeida e Eustáquio Henrique do Nascimento.
As investigações realizadas pela Polícia Civil (PC), ainda apontam que Alan, residente em Niquelândia, Norte do etstado, teria sido ameaçado pelo sargento Prado e pelo cano Luiz César dias antes. Além disso, um familiar de Salviano contou para a polícia que Prado o conhecia, e que, inclusive, teria visitado a chácara em outra ocasião. Em depoimento, Luiz César admitiu ter conhecido Alan durante abordagem, anteriormente.
Contradições
As apurações também apresentam uma série de contradições na versão dos PMs. A esposa de Alan, grávida de 3 meses, estava sozinha na chácara de Salviano e chegou a ficar detida por alguns minutos na viatura. No entanto, minutos depois foi expulsa do local. A PC acredita que ela tenha sido ‘poupada’ devido a gravidez.
Em sigilo, uma testemunha também relatou ter ouvido gritos dos policiais, falando para que entregassem as drogas e armas. Salviano teria dito que só tinha uma espingarda velha. Salviano tinha fama de traficante, mas segundo testemunhas, plantava poucos pés de maconha para consumo próprio, sua renda vinha do aluguel de casas em São Jorge.
Os PMs contaram que queimaram 500 pés de maconha, no entanto, esta versão foi contestada. A perícia realizada no local aponta que havia no máximo 5 pés de maconha e que o resto que foi queimado era outros tipos de vegetação. Os agentes também apontaram que não havia “espaço hábil” para a plantação de dois mil pés da erva, como foi apontado inicialmente pelos militares.
Relembre o caso
No dia 20 de janeiro, a Polícia Militar informou que quatro suspeitos de tráfico de drogas foram mortos em uma propriedade rural de Cavalcante, na região da Chapada dos Veadeiros. Os policiais disseram que foram recebidos a tiros e por isso atiraram de volta. No entanto, quatro dias depois, a PM os afastou. Segundo a Polícia Civil, as vítimas não tinham antecedentes criminais. Um deles era quilombola Kalunga. Na região, moradores protestaram e chamaram a ação de chacina. Uma nota de repúdio protesta contra o caso e é assinada por 134 entidades e mais de três mil pessoas.
A Polícia Militar informou à Polícia Civil que foi ao local depois de receber denúncia afirmando que na propriedade rural haveria uma grande plantação de maconha. No depoimento, os PMs afirmaram que foram recebidos a tiros e que, por isso, dispararam 58 tiros de fuzis e pistolas.
Ainda segundo os policiais militares, além dos quatro homens baleados e mortos, havia outras três pessoas que fugiram.
Repúdio da população
A nota de repúdio assinada por 134 entidades da sociedade civil e movimentos sociais de Goiás afirma que não houve embate das vítimas com a polícia. “Nenhum policial ou viatura foram alvejados ou feridos. As vítimas foram mortas por 58 tiros, sendo que 40 disparos foram feitos por fuzis”, afirma o texto.
A nota de repúdio afirma ainda que a Polícia Militar “invadiu sem mandado de prisão ou investigação prévia” a propriedade na zona rural de Cavalcante, região da Chapada. Além de entidades, a nota já foi assinada por 3.670 pessoas e, segundo a página, a meta é atingir cinco mil assinaturas.
“Salviano, Chico, Jacaré e Alan eram conhecidos por todos da comunidade e muitos possuem estórias pra contar dos momentos vividos juntos. Não eram pessoas violentas, não andavam armados. Eram pacíficos. Morreram por causa da indiferença com a vida de uma guerra insana, que condena e mata de forma seletiva uma parte da população que é preta e pobre, em verdadeiros tribunais de rua”, afirma outro trecho da nota.