O Supremo Tribunal Federal (STF), atualmente composto, tem maioria para rejeitar a anistia que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, está articulando com o Centrão para beneficiar Jair Bolsonaro e evitar sua prisão. A Corte entende que crimes contra a democracia são imperdoáveis de acordo com a Constituição. A movimentação de Tarcísio rumo à anistia surpreendeu os magistrados, que já consideram praticamente nula a chance desse perdão ser concedido. O argumento central dos ministros é que delitos contra o Estado Democrático de Direito, pelos quais Bolsonaro deve ser responsabilizado, não podem ser perdoados conforme a legislação. A maioria no STF sinalizou claramente sua posição em 2023, quando derrubou o indulto concedido por Bolsonaro ao ex-deputado federal Daniel Silveira. ‘Já ali demos a vacina para o problema’, afirmou um magistrado sobre o julgamento. Portanto, se a anistia for aprovada após o julgamento, como deseja Tarcísio em parceria com o Centrão, ela seria imediatamente barrada no STF, com o apoio de pelo menos seis dos 11 ministros da Corte. O mesmo vale para um indulto, que é o perdão dado diretamente pelo presidente da República. O caso de Daniel Silveira estabeleceu um precedente significativo. Em abril de 2022, Silveira foi condenado a 8 anos e nove meses de prisão pelo STF por incitação à violência contra o Estado Democrático de Direito e por interferência no curso do processo judicial. Um dia após a sentença, Bolsonaro concedeu o indulto ao parlamentar, mas a decisão foi anulada pela Corte. Durante seu voto, o ministro Dias Toffoli argumentou que o principal ponto de discórdia não era o fato de Bolsonaro conceder um indulto a um aliado, o que poderia ser questionável do ponto de vista ético, mas sim a concessão de privilégios a alguém que cometeu crimes contra a democracia. ‘É extremamente difícil imaginar, nesse contexto, a aplicação do perdão constitucional para crimes que atentam contra a ordem constitucional e o Estado Democrático’, pontuou Toffoli. Ele enfatizou que, embora esses crimes não estejam expressamente listados como passíveis de anistia ou indulto (como tortura, tráfico de drogas, terrorismo e crimes graves), a Constituição deixa claro que são inafiançáveis e imprescritíveis os delitos contra a ordem constitucional e a democracia. ‘Mesmo o passar do tempo não apaga, nem torna dispensável a punição por esses crimes’, acrescentou Toffoli. E completou: ‘Não tudo está escrito na Constituição. Os valores implícitos que inspiraram suas normas expressas possuem o mesmo peso e podem ser interpretados da mesma forma que as regras explícitas’. Em sua defesa, Alexandre de Moraes frisou que ‘existe uma limitação constitucional implícita para a concessão de indultos em casos que atentam contra o Estado Democrático’. Ele questionou se o STF aceitaria um indulto coletivo para todos os envolvidos nos atentados contra a democracia ocorridos em 8 de janeiro. A resposta, segundo ele, é clara: tal medida está implicitamente vetada pela Constituição. Luiz Fux manifestou-se de maneira categórica: ‘Considero que crimes contra o Estado Democrático de Direito são políticos e não passíveis de anistia, pois o Estado de Direito é um princípio inquestionável que nem mesmo o Congresso Nacional pode suprimir’. Gilmar Mendes seguiu a mesma linha, citando o jurista Lenio Streck para destacar que ‘um dispositivo legal ou constitucional que dá privilégios a um indivíduo em posição de poder estabelece limites implícitos que não estão claramente definidos’. Isso inclui a impossibilidade de perdoar crimes contra a democracia. A ministra Cármen Lúcia, em seu voto, ressaltou que ‘o Estado de Direito é uma construção fundamental contra o autoritarismo e perderia sua força se permitíssemos exceções desse tipo’.