Suspensão de Home Care em Goiânia resulta em morte de bebê de 1 ano, diz família. Dívida de R$ 4 milhões impacta atendimento.

Bebê de 1 ano morre após serviço de home care da prefeitura ser suspenso, diz família

Empresa diz que serviço foi suspenso porque os repasses estão atrasados há mais de 5 meses. Maria Ayla Pereira Silva morreu 14 dias depois de completar 1 ano.

Maria Ayla Pereira Silva, de 1 ano, morreu após serviço de home care da prefeitura ser suspenso, em Goiânia, Goiás — Foto: Acervo pessoal

Por ter nascido com uma síndrome rara, que provoca insuficiência respiratória grave, a bebê Maria Ayla Pereira Silva dependia de oxigênio quase o tempo todo. A família entrou na Justiça para que ela recebesse tratamento em casa, pago pela Prefeitura de Goiânia. Depois de quase um ano, conseguiram. Mas o serviço, chamado de Home Care, foi suspenso após uma semana de uso, porque a empresa não estava recebendo a verba pública. A menina morreu 14 dias depois de completar 1 ano.

“Ela teve uma parada cardíaca. Eu tentei. O que eu pude fazer, eu fiz, mesmo sendo leiga nesse sentido. Porque a gente treina, mas não sabe como um profissional, né? Eu tentei, reanimei, só que ela não respondia. A gente correu com ela para a maternidade, mas não adiantou”, lembra a mãe, Andréia Silva Oliveira.

A Transmedica Home Care, empresa responsável pela assistência domiciliar de pacientes que necessitam de cuidados específicos e que é uma extensão da rede de saúde pública, informou, por nota, que por conta de um atraso de mais de cinco meses nos repasses financeiros da Secretaria Municipal de Saúde, não está conseguindo dar continuidade nos serviços. A dívida ultrapassa R$ 4 milhões.

“A interrupção dos repasses da Secretaria Municipal de Saúde comprometeu gravemente a capacidade da empresa em manter suas operações, especialmente os atendimentos contínuos a pacientes de alta complexidade. O impacto dessa situação na vida dos pacientes e na sustentabilidade da empresa exige uma ação rápida e eficaz das autoridades competentes”, afirmou a empresa.

O DE entrou em contato com a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia em busca de um retorno sobre a situação do Home Care na capital, mas não houve retorno até a última atualização da reportagem. À TV Anhanguera, a Prefeitura disse que “trabalha para colocar o pagamento de todos os serviços em dia, inclusive o de Home Care”.

Criança morre após uma semana de suspensão de atendimento em Goiânia, diz família

Maria Ayla Pereira Silva nasceu no dia 12 de outubro de 2023, com síndrome de Moebius. Por conta disso, a menina passou a maior parte do tempo de vida internada em hospitais de Goiânia. A mãe, Andréia Silva Oliveira, precisou pedir uma licença no trabalho para acompanhá-la quase que em tempo integral.

Com a ajuda da Defensoria Pública de Goiás (DPE-GO), Andréia lutou para que a filha conseguisse o direito de receber o tratamento gratuito em casa, e conseguiu em outubro deste ano. A casa da família foi equipada com um berço e uma cama especial, aparelho de oxigênio e outros equipamentos.

Por uma semana, a menina pôde estar em casa, com o irmão e a família. E era acompanhada por médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e uma equipe técnica de enfermagem. No dia 22 de outubro, a família foi comunicada da suspensão.

“Para mim foi desesperador. Angustiante, né? Porque foi quase um ano de espera para poder trazer minha filha para casa. E quando finalmente a gente tem essa oportunidade de estar com ela em casa, eu perco esse amparo para cuidar dela”, explica a mãe.

Maria Ayla Pereira Silva, de 1 ano, morreu após serviço de home care da prefeitura ser suspenso, em Goiânia, Goiás — Foto: Acervo pessoal

No dia 23 de outubro, a Defensoria Pública se manifestou sobre o caso, pedindo ao Prefeito Municipal e ao Secretário Municipal de Saúde esclarecimentos a respeito do assunto. “Estamos aguardando seu retorno sobre as providências que serão tomadas para resolver a questão do atendimento home care dos pacientes”, cobrou o órgão.

Mas nenhuma atitude foi tomada. No dia 26 de outubro, a menina teve uma parada cardíaca, chegou a ser reanimada pela família e levada ao Hospital Célia Câmara, que fica a 1km da casa onde morava. Mas não resistiu e morreu.

> “Suspenderam alguns e outros não. Então, eles estão tendo que escolher quem eles vão salvar. Isso é muito triste porque a gente, que é mãe, quer o melhor para os nossos filhos, apesar das condições deles, desabafou Andreia.

DÍVIDA DE R$ 4 MILHÕES

Segundo a Transmedica, atualmente, a falta de pagamento totalizou mais de R$ 4 milhões em dívidas acumuladas, resultando em:

Suspensão parcial dos serviços de atendimento domiciliar;
Impacto direto na saúde dos pacientes atendidos, que dependem da continuidade do tratamento para recuperação ou estabilização;
Desmotivação e insegurança entre os profissionais de saúde envolvidos nos cuidados, devido à incerteza quanto ao recebimento de seus salários e à manutenção dos seus empregos.

Transmedica informa a suspensão dos serviços domiciliares à menina com síndrome rara, em Goiânia — Foto: Acervo pessoal

A empresa ressalta que a paralisação dos serviços afeta diretamente a qualidade de vida dos pacientes atendidos, uma vez que muitos deles dependem de tratamento contínuo e assistência especializada.

Para a solução do problema, a Transmedica recomenda uma reunião de urgência com representantes da Secretaria Municipal de Saúde para um plano de regularização dos repasses. Na visão da empresa, é preciso que haja a implementação de um plano de pagamento escalonado, para que a empresa possa retomar os serviços gradativamente.

CRISE NA SAÚDE

Goiânia vive um caos na saúde pública. Além dos problemas relacionados ao Home Care, durante a gestão do prefeito Rogério Cruz, três maternidades públicas suspenderam os atendimentos eletivos várias vezes ao ano por falta de recursos públicos. Além disso, nas últimas semanas, pelo menos cinco pessoas morreram à espera de leitos de UTI em Goiânia.

Nesta quarta-feira (27), o secretário de Saúde Wilson Pollara, o diretor financeiro, Bruno Vianna, e secretário executivo de Saúde, Quesede Ayres, foram presos suspeitos de pagamento irregular em contratos administrativos e associação criminosa na secretaria.

Em meio à crise, a superintendente de Gestão de Redes de Atenção à Saúde, Cynara Mathias Costa, foi nomeada como nova secretária municipal de Saúde da capital.

Rogério Cruz, prefeito de Goiânia, em coletiva de imprensa ao lado da nova secretária Municipal de Saúde — Foto: Diomício Gomes/O Popular

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Título de Cidadão Goianiense a secretário executivo seria votado na Câmara no dia de sua prisão: Justificativa destacava trabalho no Tocantins.

Título de Cidadão Goianiense de secretário executivo da Secretaria Municipal de Saúde seria votado na Câmara no mesmo dia da prisão dele

Justificativa da homenagem elenca trabalho de Quesede Henrique no Tocantins. Projeto foi tirado de pauta pelo próprio autor.

Quesede Ayres Henrique, secretário executivo na secretaria de saúde de Goiânia, Goiás — Foto: Reprodução/Carlos Costa

Quesede Ayres Henrique, secretário executivo na secretaria de saúde de Goiânia, Goiás — Foto: Reprodução/Carlos Costa

A Câmara Municipal de Goiânia votaria, nesta quarta-feira (27), um projeto para conceder o título de cidadão goianiense a Quesede Ayres Henrique, secretário executivo da Secretaria Municipal de Saúde (SMS). No entanto, no mesmo dia, Quesede foi preso durante uma operação do Ministério Público de Goiás (MP-GO).

A homenagem foi apresentada pelo vereador Markim Goyá (PRD) em 3 de julho de 2024. À DE, a assessoria da Câmara informou que o projeto foi retirado pelo próprio autor. A reportagem fez contato com a assessoria do vereador, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.

A DE também fez contato com a defesa de Quesede Ayres, mas não teve retorno até a última atualização desta matéria.

Na justificativa do projeto, elaborada em 3 de julho de 2024, o vereador Markim Goyá escreveu que o título seria um “reconhecimento aos seus destacados serviços como gestor público na área de saúde”.

Na lista de seu histórico como gestor público, o vereador faz referência a trabalhos realizados por Quesede no Tocantins, entre 2015 e 2023. Em Goiânia, o secretário executivo ocupou apenas este cargo público.

> “Quesede Ayres Henrique merece o reconhecimento público por meio da concessão do Título de Cidadão Goianiense por sua dedicação e compromisso em melhorar a atuação da saúde ao cidadão goianiense”, diz a justificativa da homenagem elaborada em julho de 2024.

A OPERAÇÃO

O secretário de Saúde de Goiânia, Wilson Pollara, foi preso na quarta-feira (27), em operação do Ministério Público de Goiás (MP-GO). Segundo os promotores, o secretário executivo, Quesede Ayres Henrique, e o diretor financeiro da Secretária Municipal de Saúde de Goiânia, Bruno Vianna Primo, também foram presos. A ação investiga pagamento irregular em contratos administrativos e suposta associação criminosa na pasta.

Em nota, a defesa de Wilson Pollara disse que irá se manifestar formalmente após ter acesso ao processo. No texto, o advogado Thiago Peres diz ainda que acredita que a inocência do secretário será provada durante as investigações.

A DE não localizou a defesa de Bruno Vianna e não teve retorno da defesa de Quesede Henrique até a última atualização desta reportagem.

De acordo com o MP-GO, a investigação aponta que os envolvidos concederam vantagens indevidas em contratos, desrespeitaram a ordem cronológica de pagamentos e causaram prejuízos ao erário público. Durante a operação, os promotores informaram que foram encontrados R$ 20.085,00 em espécie na posse de um dos investigados.

Além das práticas criminosas, o MP-GO destacou que o esquema agravou a crise na saúde pública de Goiânia. Segundo os promotores de Justiça, o esquema teria impactado o repasse de verbas a entidades como a Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc).

A Fundahc enfrenta uma dívida acumulada de R$ 121,8 milhões e tem passado por dificuldades operacionais. Em agosto deste ano, a instituição chegou a suspender os atendimentos nas maternidades Dona Íris, Nascer Cidadão e Célia Câmara, mantendo apenas os procedimentos eletivos na ocasião.

Nesse cenário, a rede pública também tem registrado falta de insumos básicos, interrupção de serviços e restrições ao acesso a leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Recentemente, mortes de pacientes à espera de vagas têm sido relatadas.

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