Cambismo e denúncias no Fiel Torcedor: por que está tão difícil comprar
ingressos no Corinthians
Polícia investiga venda ilegal de entradas na Neo Química Arena; ex-chefe da
área de tecnologia do Timão acusa diretoria de negociar com empresas reprovadas
pelo “compliance” do clube
O DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] ainda
nem sequer iniciou a venda de ingressos para a segunda final do Campeonato
Paulista, contra o Palmeiras, mas em grupos e em conversas privadas no WhatsApp
cambistas já oferecem entradas para diferentes setores da Neo Química Arena.
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Espaços populares como o Sul (atrás do gol) são negociados a R$ 600. Já lugares
“premium”, como as cadeiras do setor Oeste, chegam à bagatela de R$ 1,5 mil.
O problema não é novo, mas a sensação de torcedores e até de funcionários do
Corinthians [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] é de que
o cambismo vem se agravando nos últimos tempos. Em paralelo, tem sido cada vez
mais difícil para os membros do programa Fiel Torcedor conseguirem garantir
presença nas partidas.
Há diferentes formas de abastecimento desses vendedores ilegais. A reportagem do
ge conseguiu rastrear ingressos negociados por cambistas com três origens
diferentes: sócios-torcedores, conselheiros e até mesmo por uma conta do próprio
clube.
Qual deverá ser a estratégia para o segundo jogo da final? ge Corinthians debate
O DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/]
reserva milhares de ingressos para uso interno. Eles são repassados a jogadores,
empresários, parceiros comerciais e outros convidados do clube. Porém, alguns
acabam parando na mão de criminosos, como num caso comprovado pelo ge. Ele
ocorreu na última partida da equipe em casa em 2024, contra o Bahia, em 3 de
dezembro.
Um relatório do DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] obtido pela
reportagem mostra que dois ingressos vendidos por cambistas saíram da conta
denominada “Arrecadação – Vendas”. Eles foram adquiridos por R$ 45 cada e
vendidos por preço quatro vezes maior: R$ 180.
Os ingressos em questão estão em nome de Anderson Prado, que não foi localizado.
A “Arrecadação – Vendas” é uma das contas do DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] com mais ingressos
reservados. Na partida em que a Neo Química Arena registrou seu recorde de
público, contra o Santos
[https://ge.globo.com/futebol/times/corinthians/noticia/2025/02/12/corinthians-bate-novo-recorde-de-publico-na-neo-quimica-arena.ghtml],
na primeira fase do Paulistão deste ano, foram 2.662 ingressos designados para
este login, segundo o clube. Relatório extraído antes da partida e obtido pelo
ge apresenta uma carga ainda maior: 4.171.
Há diversas outras contas internas como essa. No jogo contra o Santos, segundo
informações fornecidas pelo DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/], foram 357 ingressos
para a conta “Comercial Arena”, 533 para “Operação Arena” e 611 para
“Arrecadação SCCP”.
Os ingressos direcionados a contas internas geram suspeitas de funcionários do
DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/]. Segundo
Marcelo Munhoes, que até janeiro era o chefe dos departamentos do clube, o volume de entradas que não são colocadas à venda no Fiel Torcedor aumentou consideravelmente desde o ano passado. A informação foi corroborada por
outros colaboradores do clube que pediram para ter a identidade preservada.
– De fato, o torcedor não está errado nessa sensação de que está mais difícil
(conseguir ingresso), que antigamente certas pontuações (do Fiel Torcedor)
compravam e hoje não conseguem mais. A nossa torcida vai crescendo a cada dia e
com certeza tem mais torcedores que também querem ir no estádio. Mas, devido a
algumas coisas que estão acontecendo no clube, de fato não está indo mais a
mesma quantidade de ingressos que até pouco tempo atrás ia para o programa Fiel
Torcedor. Então, se você tem menos ingressos disponíveis, com certeza vai
conseguir atender menos torcedores – explicou Marcelo Munhoes, em entrevista ao
ge.
– Por exemplo: o “login” do Marketing sempre existiu, mas antigamente, na gestão
anterior, eram mais ou menos uns 60 ingressos. Hoje, são dois logins, um do
próprio Marketing, de 200 ingressos, e outro do Universo SCCP, que também vai
para o Marketing, com mais uns 200. Então, veja bem, subiu de 60 para 400, e
isso a gente está falando de um único “login” – complementa.
Ainda sobre o clássico contra o Santos, em que houve recorde de público, dos
47.695 ingressos vendidos, apenas 23.360 foram destinados aos sócios-torcedores
“comuns”. Isso representa 48% do total. O DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/], por sua vez,
considera donos de cadeiras cativas e torcedores organizados em seu cálculo.
Dessa forma, o percentual de ingressos vendidos pelo Fiel Torcedor sobe para
66,7%.
Nesta partida, como tem sido praxe nessa temporada, não sobraram bilhetes para
não-sócios do Timão. Porém, o site “Ingressos DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/]”, utilizado para a
comercialização de entradas para o público geral, vendeu 784 unidades. Segundo o
DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/], esta “é
uma plataforma de vendas voltada para pedidos adicionais de parceiros e
patrocinadores que, por contrato ou regulamento, têm o direito de adquirir
ingressos extras além das cotas previamente estabelecidas.”
OUTROS CAMINHOS
Na apuração desta reportagem, o ge encontrou diversos cambistas que agem nos
arredores da Neo Química Arena e também por meio das redes sociais. Alguns deles
diziam ter à disposição dezenas de ingressos de variados setores.
Com um dos cambistas, a reportagem encontrou um ingresso proveniente de um
sócio-torcedor.
Com outro, o bilhete estava em nome de um ilustre conselheiro: Antônio José da
Silva Filho, o ex-jogador Biro Biro.
O ingresso de Biro Biro foi vendido por Ligia Gregorio Rocha, que nega ser
cambista e alega ter amigos que às vezes têm ingressos sobrando e revendem.
O ex-jogador, por sua vez, afirma desconhecer Ligia Rocha. Biro Biro também
declara que não sabe como seu ingresso foi parar com cambistas:
– Como conselheiro, a gente tem direito a comprar quatro ingressos (com
desconto, além de um de cortesia). Meu filho compra e passa pro pessoal da
família que vai. Às vezes a gente pega dois e passa dois.
INVESTIGAÇÃO POLICIAL E MEDIDAS DE COMBATE
Os casos de cambismo geraram dezenas de denúncias ao Ministério Público e à
Polícia Civil, que no ano passado abriu inquérito para apurar o caso. A
investigação é conduzida pela 4ª Delegacia de Crimes Cibernéticos, que já
intimou funcionários do DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] a prestar
depoimento. O Conselho Deliberativo do clube também compartilhou informações com
as autoridades quando requisitado.
Ao ge, o DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] diz que adota diversas medidas para combater o cambismo, como monitoramento de
redes sociais e bloqueio de compras irregulares. Porém, o clube adverte que
“para que essa prática seja caracterizada como crime, é necessário que a vítima
registre a denúncia. Infelizmente, o torcedor que adquire ingressos de terceiros
também contribui para uma ação irregular.”
O DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] também
foi categórico em afirmar: “a solução para suprir o cambismo está no
reconhecimento facial.” Por lei, os estádios com capacidade para mais de 20 mil
pessoas têm até junho de 2025 para utilizar essa tecnologia.
Ainda de acordo com o Timão, “o clube está realizando estudos para a
implementação desse sistema.”
Porém, segundo Marcelo Munhoes, a diretoria alvinegra vem adiando
sistematicamente a contratação e implementação da biometria.
– Esse é um projeto que não sai do dia para a noite, precisa instalar
equipamentos, fazer ajustes, fazer testes pilotos com setores, até que a gente
consiga ter segurança e colocar para a arena como um todo. A gente precisava já
ter começado, nosso objetivo era ter começado em outubro de 2024. Mas, como
havia indefinição de quem seria o fornecedor, isso foi postergado – explica o
antigo responsável pela área de tecnologia do DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/].
– Em janeiro (de 2025), o clube precisava renovar o contrato do controle de
acesso. Como eu percebi que não havia mais tempo, que a gente não ia atender as
obrigatoriedades e iria passar vergonha sem o reconhecimento facial em junho, eu
tomei a frente e renegociei o contrato com o atual fornecedor. É uma empresa que
já tem vários anos no clube, tem todas as integrações desenvolvidas, já domina o
sistema, é um caminho muito mais curto para a gente chegar na implementação do
reconhecimento facial – completa Munhoes.
O ex-chefe de tecnologia afirma que fechou negócio para fornecimento destes
equipamentos com a empresa Ligatech, que já cuida das catracas e de todo o
controle de acesso da Neo Química Arena atualmente. Porém, segundo ele, o
DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] desfez
tal acordo:
– Eu levei essa notícia numa reunião da diretoria, informei inclusive que os
aparelhos chegariam naquele dia. Porém, no dia seguinte fui destituído do meu
cargo e cancelaram a entrega dos equipamentos.
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[https://ge.globo.com/futebol/times/corinthians/]
EX-FUNCIONÁRIO FAZ DENÚNCIAS
Desde o início da gestão do presidente Augusto Melo, em janeiro de 2024, o
DE [https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] estuda
formas de melhorar o sistema Fiel Torcedor. Neste sentido, o clube passou a
buscar uma nova parceira para cuidar da administração do programa. Desde 2023,
ele é hospedado em plataforma da empresa One Fan.
No ano passado, o departamento de tecnologia do DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/], com auxílio da
consultoria Alvarez & Marsal, iniciou uma RFP (sigla em inglês para Request for
Proposal, que significa “solicitação de proposta”).
Das empresas participantes dessa espécie de licitação, duas delas não foram
aprovadas pela área de conformidade (“compliance”) do clube: 2GO Bank e Ticket
Hub. A 2GO Bank, inclusive, foi acusada pela Polícia Federal de lavar dinheiro
para o PCC no mês passado.
[https://g1.globo.com/economia/noticia/2025/02/25/2go-bank-e-invbank-as-fintechs-acusadas-pela-pf-de-lavar-dinheiro-para-o-pcc.ghtml]
– A 2Go Bank, para ser honesto, eu nem conhecia. Eu fui (falar com eles) a
pedido da diretoria. Mas, rapidamente, eu constatei que eles não tinham
experiência no futebol e eu mesmo comentei com eles na época. Falei: “olha,
vocês querem pegar o maior clube do país e ainda não atendem nenhum grande
clube? Me desculpa, mas eu não vou ser cobaia de vocês.” E o que eu percebi? Que
houve uma insistência. Porque o presidente (Augusto Melo) falou: “olha, a gente
quer um projeto inovador, que tenha um banco por trás, que seja bem diferente.”
Eu e o Fred (Luz, consultor da Alvarez & Marçal) batemos o pé. Falamos que a
gente tinha que fazer o básico primeiro – relata Marcelo Munhoes.
O ge questionou o DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/] se a direção
alvinegra manteve negociações com as referidas empresas mesmo após recomendação
contrária do “compliance”. Em resposta o clube disse que “o próprio
ex-funcionário da TI informou ao presidente que o problema no compliance foi
encontrado por um erro de digitação do CNPJ da empresa.”
Munhoes rebate tal alegação:
– O presidente Augusto Melo me mostrou um print em seu celular onde o CNPJ de um
dos fornecedores estava digitado errado. Expliquei que ele estava me mostrando
uma versão do documento bastante desatualizada e erros poderiam ser encontrados
por não ter sido finalizado na época. As versões posteriores e inclusive
apresentadas para a diretoria já se encontravam todas revisadas e corretas –
afirma o ex-chefe da área de tecnologia.
– A gente fez tudo olhando a parte técnica. Olhando melhor para o DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/]. Não existe
interesse pessoal particular de ninguém – complementa.
Ainda segundo o DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/], “a 2GO Bank não
está envolvida em nenhuma negociação com o clube. A Ticket Hub, assim como
Futebol Card, Ingresse, Imply e outras, é uma das empresas que apresentaram
propostas ao clube.”
Segundo Marcelo Munhoes, até o fim de janeiro, quando ele estava no clube, a
Ticket Hub era a empresa favorita da diretoria para assumir o Fiel Torcedor. O
ex-funcionário questiona essa preferência:
– Depois que 2GO Bank saiu do processo a preferida era a Ticket Hub, cujos
sócios comandavam a BWA. Além de não ter sido aprovada pelo “compliance”, o
preço dela é bem mais alto do que a empresa que teve a melhor classificação. Só
para vocês terem uma ideia, na parte de reconhecimento facial, chega a ser o
dobro do preço do que a gente tem de melhor no mercado.
Ao ser desligado do DE
[https://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/], Munhoes relatou em
e-mail todo o processo de escolha da nova fornecedora de tecnologia do Fiel
Torcedor. A mensagem foi enviada ao presidente Augusto Melo, aos vices Osmar
Stábile e Armando Mendonça e ao diretor jurídico Vinicius Cascone. Em um dos
trechos, ele elenca os motivos pelos quais não recomenda a Ticket Hub:
Outro ponto questionado por Marcelo Mun