Última atualização 29/04/2022 | 11:16
A possibilidade de retomar a vida é o que incentiva 222 pessoas na fila de espera por um transplante de rim em Goiás, segundo informações de março deste ano da Secretaria Estadual de Saúde (SES-GO). Em dezembro, esse número era de 194 pacientes. O método é um dos mais efetivos e de melhor custo-benefício para reabilitar o paciente com insuficiência renal crônica terminal. O órgão é um dos mais procurados, mas os pacientes esbarram na falta de compatibilidade e na recusa das famílias em autorizar a doação.
A última situação, especificamente, impede que mais pessoas sejam salvas e posterga a realização do sonho de viver longe de visitas médicas semanais. Apesar disso, o cenário pode se tornar favorável ao procedimento com a boa vontade das pessoas. Esse foi o caso de Luzivaldo Dantas, para quem os dias aguardando a recuperação da saúde chegaram ao fim.
Ele foi submetido a um transplante renal em 2016 após três anos passando por hemodiálises – tratamento que permite remover as toxinas e o excesso de água do organismo. O antigo desejo se tornou possível graças à doação de Doralice Silveira, prima da esposa dele.
“Não imaginava passar pelo transplante tão rápido. Foi coisa de Deus!”, afirma. Desde então, o impossível foi vencido pela esperança. “Tudo mudou para melhor: posso trabalhar, posso beber água. Enfim, voltei à vida ao normal“, destaca.
O procedimento ao qual Luzivaldo foi submetido é diferente daquele pelo qual passa a maior parte dos pacientes pelo fato de o órgão ter sido doado por uma pessoa viva. Menos comum, esse tipo de procedimento é chamado transplante renal intervivos. Essa opção está mais relacionada à disponibilidade, interação e possibilidade de o transplante ser bem sucedido, segundo o nefrologista Ricardo Mothé.
“O transplante intervivos não é restrito a casos mais graves e independe da particularidade do receptor. Alguns pontos são levados em consideração, como se o paciente com insuficiência renal estiver muito grave e for alta a chance de óbito. Em geral, vale para qualquer paciente renal crônico desde que tenha doador voluntário, critérios de eleição para um bom transplante e ausência de prejuízo mental, de saúde e social do doador e da família”, explica.
Essa é a única modalidade de transplante em que o órgão é direcionado especificamente para uma pessoa, porém deve estar inscrita na fila de espera que não é única, mas subdividida em quatro, de acordo com o tipo sanguíneo (A, B, AB, O). A cirurgia é delicada por muitas razões de cuidado com o receptor e doador, preparação e transplante do rim e complexidade da equipe envolvida na cirurgia, que dura de duas a quatro horas.
“A assistência médico-hospitalar para o doador e receptor no pré e pós-operatório é multidisciplinar. Um número considerável de especialistas participa da cirurgia de transplante, como urologista, nefrologista e anestesiologista. Em alguns casos, o cirurgião vascular entra para auxiliar e o cirurgião do aparelho digestivo também, quando necessário. No pré-transplante, há o acompanhamento de um nefrologista, cardiologista, otorrinolaringologista, odontólogo, psicólogo, endocrinologista, gastroenterologista e/ou hepatologista”, detalha o especialista.
Ele destaca que o transplante de rim não se resume à cirurgia nem é a cura, embora tenha vantagens em relação à diálise e hemodiálise. Na verdade, o procedimento é uma forma mais confortável de tratamento para devolver a qualidade de vida ao paciente, desde que o procedimento tenha sido bem sucedido. A questão não é apenas anatômica. Mothé justifica que alguns pacientes têm bastantes limitações, não tem boa interação com as medicações pós-transplante devido aos efeitos colaterais, outros desenvolvem complicações cirúrgicas ou infecções recorrentes.
O nefrologista esclarece que não há dados robustos na literatura médica sobre a expectativa de vida de pacientes com transplante. “Em princípio, comparando o paciente com transplante com aquele na fila aguardando um rim, a mortalidade no primeiro ano do que já passou pela cirurgia é menor do que a do segundo grupo e também em relação aos que estão em hemodiálise. O que temos de concreto sobre isso são dados de sobrevida do enxerto que é em torno de 10 anos, o que é um ótimo resultado”, pontua.
Obstáculo
Apesar de o Brasil ter o maior índice de aprovação do mundo à doação de órgãos e ser considerado referência mundial em transplantes, conforme levantamento realizado ano passado pela Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), o número de doações efetivas ainda é baixo em relação ao número de pessoas que aguardam em lista.
No ranking nacional em doação de órgãos, a taxa de doadores efetivos no Brasil, que era de 18,1 por milhão de habitantes em 2019, caiu para 15,8 por milhão de habitantes, mesmo patamar de julho de 2017. Isso por causa da pandemia, que diminuiu as equipes especializadas na cirurgia de transplante para cobrirem outras áreas, além da recusa das famílias em autorizar a doação por não saber da vontade do parente.
Por lei, o consentimento dos familiares é a única forma de autorizar o procedimento. Assim, mesmo com documento expresso do desejo, a pessoa falecida não poderá ter os órgãos doados se não houver aprovação da família. Dessa forma, a retirada de órgãos de indigentes também é proibida, sob pena de reclusão por dois a seis anos.
A média mensal do procedimento em Goiás varia, porém, os dados indicam 11 transplantes renais por mês. . Entre janeiro e novembro de 2021, Goiás registrou 105 transplantes, número 4,5 vezes menor do que o líder no ranking nacional, São Paulo, com 476. Apesar disso, a SES Goiás informa que entre o estado é o décimo em um ranking nacional dos que mais realizam transplantes renais no país.