Árduas jornadas de trabalho, desamparo das empresas, riscos e o desespero de ficar sem renda com contas vencendo ou um carro para arrumar. Esses são alguns dos dilemas enfrentados pelos mais de 15 mil motoristas de aplicativo de Goiânia, que pela necessidade de complementar a renda, arriscam as próprias vidas e de terceiros com jornadas cansativas de trabalho – aumentando os riscos de acidentes.
Na última sexta-feira (3), por exemplo, um ciclista de 59 anos morreu, após ser atropelado na GO-070, em Goiânia. O motorista que atingiu Marco Rosa afirmou ter cochilado ao volante e não ter visto o homem com a bicicleta no acostamento. O condutor havia acabado de deixar uma passageira em Goianira e retornava para a capital no momento em que atropelou a vítima.
O vice-presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativos do Estado de Goiás (Amago), Rodrigo Vaz, estima que ao menos cinco motoristas de app se envolvam em acidentes por mês na capital. Ele conta que muitos desses motoristas precisam ser ajudados pela categoria, seja com uma “vaquinha” ou doação de cestas básicas, visto que muitos tiram o sustento do veículo.
“A profissão está para ser extinta devido aos obstáculos, como o alto preço do combustível. Para termos uma renda boa, precisamos trabalhar muito, de cerca de 12 a 16 horas. Tem gente que já ficou 24 horas seguidas trabalhando. Eu mesmo trabalho cerca de 12 horas por dia para conseguir bater a meta e pagar a faculdade, além de arcar com os custos de casa, explica.
Faltam leis
A rotina surreal de trabalho envolvendo a categoria é uma realidade vivida por muitos trabalhadores, uma vez que não existem leis trabalhistas que regulamentam as horas que devem ser cumpridas pelos motoristas de app, segundo o Presidente da Comissão de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), José Humberto Abrão.
José explica que uma lei de 2018, buscou regulamentar o transporte remunerado privado individual de passageiros, mas que essa lei estabelece aos municípios e ao Distrito Federal (DF), a autonomia de regulamentar os serviços. A lei, inclusive, também determina que os motoristas precisam apresentar certidão negativa de antecedentes criminais. Porém, não há regras quanto a horas trabalhadas, já que por ser prestação de serviço autônomo, o próprio motorista determina sua jornada.
“Existe um decreto que regulamenta esse trabalho, o 2890/2017. Não sei se hoje há lei específica, mas creio que não. O risco de se normatizar é gerar um aumento de carga tributária e regulamentações poderia acarretar um aumento de custo para os usuários. Ademais, do ponto de vista prático, seria extremamente complexo a fiscalização de normatização de limitação de jornada”, explicou.
Falta de apoio
A categoria comenta que a falta de apoio das empresas de transporte é outro fator que complica a vida dos motoristas, já que a empresa fica com parte do pagamento das corridas apenas por marcar a viagem. O motorista Miguel Veloso, por exemplo, já sofreu dois acidentes enquanto trabalha e teve de arcar com o prejuízo de arrumar o carro e “ficar parado”.
“Das vezes que aconteceu acidentes comigo, a empresa não me ajudou em nada. A empresa apenas libera a plataforma e define a rota para que os parceiros possam trabalhar. Depois disso, ela não faz mais nada para beneficiar o moto entregador e o motoristas por aplicativo. Nunca fui assaltado, mas há vários relatos de parceiros que foram assaltados durante o exercício do trabalho e também não tiveram apoio”, concluiu.