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Por que as “saidinhas de Natal” debocham do cidadão brasileiro

Última atualização 28/12/2020 | 13:53

Acabei de ler a notícia de que nesta terça-feira, 22, Suzane von Richthofen deixará a Penitenciária Maria Eufrásia Pelletier, no interior de São Paulo, para mais uma das famosas “saidinhas” de Natal e Ano Novo. Para quem não se lembra do caso, ela foi presa em 2002 por matar os pais e ficará em liberdade até o dia 5 de janeiro.

Com ela, outros 33 mil devem ser liberados somente no estado de São Paulo, com permissão de João Dória. Mas você, que nunca cometeu crime, por favor: fique em casa e não saia neste Natal! Dória já se defendeu, e disse que a decisão é da Justiça, e não dele. Então, que não prometesse acabar com a prática durante sua campanha, em 2018. Admiro Dória pelo contorcionismo verbal: cheio de contradições, passeia como “barata tonta” diante dos eleitores e continua voltando para casa como governador.

Você que lê, procure notícias sobre “saidinhas de Natal” e veja só os comentários do povo. Veja se estou mentindo: o “benefício”, amparado por lei (7.210/1984), soa como piada para a maioria esmagadora dos brasileiros. “Ela saiu para visitar a família!”, li alguém comentando na notícia de Suzane.

É bom lembrar algumas coisas antes de prosseguir: só os que cumprem pena em regime semiaberto é que podem sair, até 4 vezes por ano, depois de cumprirem 1/6 da pena. Pasmem: essas ‘saidonas’ (como prefiro chamar) podem durar até sete dias. Quatro vezes por ano, sete dias por vez: 28 dias fora da cadeia (ou um mês de fevereiro).

Se você ainda não entendeu o absurdo, aí vai outra comparação: na Itália, há poucos dias, o governo decretou que cada pessoa só poderá sair de casa uma vez para uma visita, no dia do Natal. Quem tem mais liberdade? Suzane Von Richthofen, ou qualquer italiano em lockdown?

Pessoalmente, acredito no poder do perdão. Não duvido nem nunca duvidei na possibilidade de arrependimento e remissão da moça que matou os pais, ou de qualquer outro criminoso. Torço para isso.

Mas, qual o recado que a Justiça brasileira dá à criminalidade? “Saia no Natal”, “cumpra somente 1/6 da pena”, “tenha cela especial por ter estudado mais”, ou ainda: “se for rico, pague sua fiança e saia daqui!”. Este é o motivo de tanta violência, morte, dor e crime que assusta e sempre assustou o Brasil: não há Justiça.

Uma canção antiga tem o verso: “em terreiro sem galo, quem canta é frango e franguinha!”. Talvez, se o crime não fosse facilitado, mas temido, todo criminoso pensaria duas vezes antes de assaltar você, leitor. Quantas mortes teríamos a menos por ano se a lei fosse forte no país? Quantas pessoas você ainda teria a seu lado se tivéssemos um código isento de privilégios?

Todos temos que arcar com as consequências das nossas atitudes. Tenho pena de presidiários? Sim, eu tenho. E daí? É completamente possível se compadecer do outro e permanecer reto com a Justiça. É doloroso, mas é a realidade com a qual devemos lidar. Não deixe que ninguém te pinte como um ‘monstro’ quando apenas defende o cumprimento da Justiça! Quem não compreende essa dualidade, entre Justiça e Misericórdia, não está pronto para discutir nada sério na vida.

Imagem: TV Record