Bebês são vendidos como mercadoria pelas redes sociais, em Goiás

Bebês

Bebês vendidos como mercadoria ou entregues por mães que não conseguem arcar com os gastos de criar um filho. Trata-se da chamada adoção à brasileira, bastante comum no país. A prática faz parte da realidade vivida por muitas famílias e que foi acompanhada de perto, durante duas semanas, pelo Diário do Estado –  que se infiltrou em grupos de redes sociais como WhatsApp e o Facebook, a fim de acompanhar esse processo ilegal de adoção.

A reportagem, inclusive, chegou a negociar com uma mulher grávida de seis meses e “encomendou” um bebê por R$ 4 mil. A mulher, de São Miguel do Araguaia, explicou que não tinha condição de criar o bebê por já ter outros três filhos. Mãe solteira, pediu ajuda durante a gestação e se dispôs a vir a Goiânia para seguir com o pré-natal até o nascimento da criança e, consequentemente, a entrega. (Confira dialogo abaixo)

“Mercado livre”

Este foi apenas um dos casos acompanhados pelo DE. Nos grupos, as mulheres de diferentes estados brasileiros, se identificam como adotantes e BIO’s (doadoras ou vendedoras de crianças). Durante as conversas, elas enviam uma série de mensagens anunciando crianças que já nasceram ou que ainda estão por vir, com foco em mulheres que alegam não conseguir ter filhos e que estão em busca de uma criança para adotar. Assim como a mãe que negociou com a reportagem, as BIO’s dizem não ter dinheiro para criar o filho que não foi planejado.

As adotantes, por outro lado, afirmam ter condições financeiras para dar “boa vida” à criança, oferecendo dinheiro para ajudar na gestação e uma quantia maior para que a criança seja entregue. Outras apenas dizem que vão ajudar durante a gestão, pagando exames e consultas, além de arcar com a locomoção da “BIO”. Muitas mulheres procuram meninas, outras meninos, mas grande parte diz não ter preferência por sexo. Durante as longas conversas, elas trocam conselhos e até pedem ajuda para escolher o nome da criança.

Ao serem questionadas pela reportagem, que se passou por uma mulher em busca de filho adotivo, elas falaram que escolheram a opção ilegal por não aguentar mais esperar na fila de adoção. Astutas, as mulheres evitam falar sobre o preço pago para que as mães entreguem as crianças.

“Falar sobre esse assunto é muito perigoso, principalmente pelo WhatsApp. A gente nunca sabe quem está do outro lado acompanhando a conversa. Há muitos relatos de pessoas que foram presas por comprar e vender crianças então é bom evitar. Esses dias, em São Paulo, um homem foi preso após comprar o filho de uma usuário de drogas por R$ 5 mil”, explicou uma adotante.

Adoção à brasileira

A adoção à brasileira, segundo a titular da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) de Goiânia, Caroline Borges Braga, consiste no reconhecimento voluntário por parte dos pais (ou de apenas um) da paternidade de um filho alheio. Desse modo, deixam de seguir os procedimentos legais exigidos em um processo de adoção. Ela conta que a prática também ocorre quando, por exemplo, um homem se casa com uma mulher que já tem um filho de outra relação e decide registrá-lo em seu nome, como se fosse seu. Também acontece quando a mãe, por qualquer motivo, entrega o recém-nascido a pessoas que o reconhecem como filho biológico.

Esse tipo de adoção, porém, é considerada crime, sendo que a pessoa que adota ou doa a criança pode pegar pena de até seis anos, além de multa. Haja visto que a prática priva a criança de todos os direitos previstos pelo Estado para um processo de adoção. Vale lembrar que o adotante também pode responder por falsidade ideológica. Já as mães que decidem vender a criança e a pessoa que decide comprá-la, por incrível que parece, podem ter uma pena menor, mais precisamente de até quatro anos.

“Essas crianças estão expostas a todos os tipos de riscos, visto que estão sendo entregues a um desconhecido. A pessoa pode falar que tem o sonho de ser mãe ou pai, mas também pode ter segundas intenções. Essa criança, inclusive, corre risco de ser submetida a todo tipo de agressão e exploração, até mesmo a exploração sexual infantil”, concluiu.

Conversa

Repórter: Bom dia, amiga! Entrei em alguns grupos de adoção, mas tem muito golpe. Você doaria a sua criança pra mim? Eu ajudo vc financeiramente e até posso te dar uma quantia em dinheiro depois de você dar a luz. Meu marido é louco por causa de um filho e estamos querendo adotar.

Vendedora: Bom dia! Vocês são da onde?

Repórter: Somos de Goiânia.

Vendedora: Coincidência. Estava querendo ir embora para Goiânia. Só não fui ainda por causa da gravidez. Porque se minha família souber ou as pessoas, vou ter que ficar com a criança.

Repórter: Super entendo. Você mora onde?

Vendedora: Em São Miguel do Araguaia. Fiz seis meses hoje. Nossa, estou sem chão. Não sei o que fazer.

Repórter: Super entendo. Você tem interesse de me vender ele? Pode falar seu preço.

Vendedora: Quanto você poderia me ajudar financeiramente até a criança nascer? E depois que eu der a luz?

Repórter: Com a sua experiência como mãe, quanto acha que precisa? Eu não tenho a mínima ideia, rs. Quanto você quer para me doar a criança? Me fala seu preço q eu vejo como fica pra mim.

Vendedora: Os gastos seriam maiores porque teria que ir embora da minha cidade pra Goiânia. Teria que me ajudar durante a gravidez e depois que eu der a luz me dar um valor. Seria R$ 4 mil mais os gastos durante a gravidez, porque vou estar sozinha e não tenho condições de cuidar certinho da gravidez e me virar em Goiânia só.

Repórter: Os R$ 4 mil seria depois que você me entregasse o bebê?

Vendedora: Metade antes e metade depois. Falta 126 dias para nascer, fiz 22 semanas hoje.

Repórter: O pagamento pode ser por PIX?

Vendedora: Sim, mas antes teria que ajeitar tudo certo aqui, deixar meus outros filhos com o pai porque vou para Goiânia. Aqui não posso ficar. Preciso que você me ajude durante a gravidez até o nascimento. Como você consegue? Inclusive, preciso fazer a ultrassonografia para descobrir o sexo.

Repórter: Tá bom. Vou falar com o meu marido também.

Vendedora: Tá. Conversa certinho com ele. Vocês ainda não tem filhos, né?

Repórter: Vou conversar sim. Ainda não.

Vendedora: Estou sem saída, mas tenho certeza que você vai cuidar bem da criança. Filho e benção mesmo sendo a gente que gerou ou não. Até porque mãe e pai e quem cria.

Dialogo entre repórter e vendedora. (Foto: Reprodução/Pedro Moura)

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BYD cancela contrato com empreiteira após polêmica por trabalho escravo

Na noite de segunda-feira, 23, a filial brasileira da montadora BYD anunciou a rescisão do contrato com a empresa terceirizada Jinjiang Construction Brazil Ltda., responsável pela construção da fábrica de carros elétricos em Camaçari, na Bahia. A decisão veio após o resgate de 163 operários chineses que trabalhavam em condições análogas à escravidão.

As obras, que incluem a construção da maior fábrica de carros elétricos da BYD fora da Ásia, foram parcialmente suspensas por determinação do Ministério Público do Trabalho (MPT) da Bahia. Desde novembro, o MPT, juntamente com outras agências governamentais, realizou verificações que identificaram as graves irregularidades na empresa terceirizada Jinjiang.

Força-tarefa

Uma força-tarefa composta pelo MPT, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Defensoria Pública da União (DPU) e Polícia Rodoviária Federal (PRF), além do Ministério Público Federal (MPF) e Polícia Federal (PF), resgatou os 163 trabalhadores e interditou os trechos da obra sob responsabilidade da Jinjiang.

A BYD Auto do Brasil afirmou que “não tolera o desrespeito à dignidade humana” e transferiu os 163 trabalhadores para hotéis da região. A empresa reiterou seu compromisso com o cumprimento integral da legislação brasileira, especialmente no que se refere à proteção dos direitos dos trabalhadores.

Uma audiência foi marcada para esta quinta-feira, 26, para que a BYD e a Jinjiang apresentem as providências necessárias à garantia das condições mínimas de alojamento e negociem as condições para a regularização geral do que já foi detectado.

O Ministério das Relações Exteriores da China afirmou que sua embaixada e consulados no Brasil estão em contato com as autoridades brasileiras para verificar a situação e administrá-la da maneira adequada. A porta-voz da diplomacia chinesa, Mao Ning, em Pequim, destacou que o governo chinês sempre deu a maior importância à proteção dos direitos legítimos e aos interesses dos trabalhadores, pedindo às empresas chinesas que cumpram a lei e as normas.

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