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Criminosos usam grupos secretos para induzir jovens e adolescentes ao suicídio

Última atualização 26/08/2022 | 14:01

“Manda um PIX de R$ 10 que eu digo. Se você fizer o que eu vou dizer, você vai morrer sem muita dor. Faz sentido o que eu vou falar, mas não diz isso a ninguém, senão sua mente vai está {SIC] em outro canto e você vai sentir muita dor”, diz mensagem divulgada em um grupo de 78 pessoas, de diferentes níveis sociais e regiões do país, inclusive, de Goiás.

A mensagem faz parte do leque de ameaças e métodos divulgados por criminosos, que usam grupos nas redes sociais para induzir jovens e adolescentes ao suicídio, sob alegação de que as vítimas não precisam viver ‘em sofrimento’. Com exclusividade, o jornalismo do Diário do Estado (DE) acompanhou por três semanas esses grupos secretos, que são administrados por pessoas que se passam por religiosos e profissionais da saúde. 

As pessoas que se apresentam como enfermeiros, inclusive, oferecem medicamentos (para que a pessoa cometa suicídio) e explicam passo a passo como a vítima pode tirar a própria vida. Eles ainda afirmam que a pessoa pode ser salva (ir para o céu) desde que seja cristã.

Cuidadosos, a cada método ensinado – e cobrado – os criminosos que, inclusive, planejam um suicídio em massa (a data não será divulgada por questões de segurança), ameaçam os usuários nas redes sociais para que apaguem as mensagens antes de cometer o suicídio, a fim de que o grupo não seja descoberto.

“O suicídio é um pecado como qualquer um, porém, as pessoas que vão  para paraíso são as que seguem os ensinamentos bíblicos, fazendo coisas boas. O suicídio não vai te levar para o céu ou inferno. O que irá te salvar são as suas boas ações aqui na terra. Mas você tem que ser cristão, se não for cristão não dá”, explicou um dos criminosos ao repórter, que se passou por uma pessoa depressiva.

Criminosos pedindo para que vítimas apaguem mensagens antes de tirar a própria vida. (Foto: Pedro Moura)

Carta aberta

Contrariando um dos administradores, um jovem divulgou carta aberta no grupo expondo suas tristezas e agradecendo um dos criminosos por tê-lo incentivado e dado coragem para cometer o suicídio. Além de expor o administrador, ele também diz a forma como pretende tirar a própria vida e que aproveitaria a ausência da mãe durante à noite para cometer o suicídio.

Horas depois do anúncio do participante e de sua despedida, um outro usuário – que se identificou como primo da vítima – divulgou que o parente estava morto. Em tom de sofrimento, ele pediu para que os demais participantes não cometessem a mesma ação e até questionou a existência do grupo.

“Wander faleceu. Nunca sabemos a dor do próximo. Irmã dele está arrasada. Avisaram que ele estava no grupo, mas era tarde demais. Sou primo dele e agora vi os sinais. Galera, se amem. Ninguém merece isso. Ninguém fala nada. Isso não é normal não”, disse o parente.

Anúncio de um dos parentes das vítimas que cometerem suicídio. (Foto: Pedro Moura)

Traumas e métodos

No grupo, pessoas a todo momento pensam em tirar a própria por diversos motivos. Os relatos são pesados. Entre as vivências compartilhadas no espaço, que funciona 24h, as pessoas abordam traumas psicológicos e abusos sexuais. Já os métodos ensinados pelos criminosos, que não serão citados pela reportagem por questões de segurança, surpreendem.

Já os argumentos são diversos, entre eles, o do perdão. “Você acha que Deus iria mandar alguém para o inferno porque não aguenta viver aqui na terra? Na bíblia diz que Deus é justo. Deus não criou o ser humano pra viver assim. O suicídio é uma opção. Todo mundo vai morrer um dia”, justificou um dos criminosos que se apresentou como Esdras. 

A mensagem foi enviada em resposta a uma mulher de 26 anos, moradora de Itumbiara que disse estar sofrendo e que não queria mais viver.

Crimes 

O ato de induzir, ensinar e até mesmo vender medicamentos para que a pessoa cometa suicídio pode configurar em pelo menos quatro crimes, de acordo com o delegado Daniel José de Oliveira, sendo: auxílio a suicídio ou a automutilação,  lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, falsificação e corrupção.

O investigador aconselha que, no caso de pessoas menores de idade, os pais ou responsáveis acompanhem a atividade do filho nas redes sociais, principalmente em grupos. Ele também orienta que nas plataformas como WhatsApp e Facebook, sempre há a possibilidade de se denunciar conteúdos impróprios.

“As investigações se resumem em apurar quem são essas pessoas por trás dos grupos. Para isso, são realizadas várias diligências cibernéticas, buscas e apreensões. Quanto mais gente reportando essas ações, mais rápido essas empresas podem derrubar esse tipo de grupo e remover o conteúdo”, explicou.